Eu nunca gostei muito da brincadeira de amigo oculto, tão comum entre nós por ocasião do Natal.
Reconheço que é uma coisa prática, algumas vezes até divertida, outras vezes a única alternativa viável, principalmente nas festas de final de ano de empresas. Mas tenho a sensação de que é algo meio sem nexo, a depender do que aconteça no sorteio.
Eu já fui amigo oculto de um colega de trabalho que só conhecia de vista. Que dificuldade, comprar um presente para uma pessoa que quase não conheço, com quem não tenho a menor intimidade, não sei das preferências e por quem não sinto afeição. Para aquela pessoa eu seria oculto, mas não amigo. E assim foi: dei o presente e continuamos a trabalhar na mesma empresa, sem ocultação e sem amizade.
Soube de um grupo em que, ao invés de estabelecer uma faixa de preço, fixaram o próprio presente: um par de sandálias havaianas. Cada um compra sem saber o tamanho do pé do presenteado e depois o sortudo tem que ir na loja para trocar pelo tamanho certo. Fico em dúvida se neste caso se aplica o verbo presentear…
Certa vez, de brincadeira, sugeri num amigo oculto em família, que cada um colocasse o valor estabelecido em dinheiro num envelope e desse de presente ao seu amigo oculto. No final ninguém precisaria trocar nada, nem haveria insatisfação por diferença de presentes. Minha proposta era tão absurda que arrancou risadas. Parecia ridícula. E era, claro.
Entretanto, um amigo não oculto me contou sobre um evento destes ocorrido no colégio onde trabalhava, que me fez repensar tudo que acabo de manifestar.
Em plena pandemia, com os muitos problemas decorrentes e as necessárias adaptações, meu amigo Rui, que era o coordenador pedagógico da escola, recebeu a ligação de uma professora, contestando algumas orientações sobre as aulas on-line que inevitavelmente precisaram ser praticadas.
Até então se entendiam bem e mantinham um relacionamento cordial. Mas naquele dia tudo mudou. Não chegaram a um entendimento, melhor dizendo, chegaram a um desentendimento. A professora Zélia, com pouca prática no uso dos recursos virtuais, insistia em discordar das orientações.
Em determinado ponto da conversa Rui foi mais enfático e Zélia acabou por desligar abruptamente o telefone, sem se despedir. Foi o chamado bater o telefone na cara de alguém, coisa agressiva e desconcertante. Quase um tapa…
Daí em diante já não se falavam mais. Uma por ter dado a batida de telefone, o outro por tê-la recebido. Somos assim: o tempo que levamos para construir uma boa relação é medido em meses ou anos, mas o tempo para rompê-la se mede em segundos.
Decorreu o primeiro ano da pandemia e, por razões óbvias, não houve a tradicional festa de Natal do colégio. Mas no ano seguinte, em dezembro, a direção entendeu que seria possível e até mesmo necessário realizar o alegre evento, marcando o início da desejada volta à normalidade.
O sorteio do amigo oculto foi realizado num aplicativo de computador, para garantir o sigilo e o perfeito seguimento das regras. Afinal eram mais de 80 participantes. Rui estava um pouco tenso na hora de sortear. Claro, temia tirar a Zélia. A probabilidade era pequena, mas poderia ocorrer e Rui desejava evitar esta situação constrangedora.
Clicou com o mouse no botão de sorteio e aguardou com expectativa. Qualquer um, menos ela, pensava enquanto aguardava o resultado. Felizmente o sorteio ofereceu a ele outra pessoa. Com esta sim, tinha uma relação amigável e sem sombras. Que alívio.
No dia da festa, o momento mais esperado era o amigo oculto. Não pelos presentes em si, mas porque somente após esta etapa eram servidos os petiscos e bebidas.
Seguia a troca de presentes, até que num determinado momento foi sorteada a Zélia. Ela recebeu seu presente, agradeceu e agora era sua vez:
— O meu amigo oculto é uma pessoa maravilhosa.
Muitos levantaram a mão, como é a brincadeira de praxe.
Zélia continuou:
— Sempre gostei muito desta pessoa, admiro seu jeito de ser e tenho por ela muito respeito e admiração.
Novas mãos levantadas, exclamavam: eu, eu, eu… Alguém gritou:
— É homem ou mulher?
— Homem. É uma pessoa muito inteligente, bem-humorada e agradável de conviver. O coronavírus nos afastou um pouco. Mas o que mais criou distância entre nós foi a minha impaciência. Meu amigo oculto, a quem peço muitas desculpas, é o Rui!
Rui levantou emocionado e deram o mais demorado abraço da festa, sob uma chuva de aplausos. Muitos sabiam da desavença entre eles e assistiam, naquele momento, à beleza da reconciliação.
Rui abriu o presente de Zélia e disse então:
— Eu fui o único a ganhar dois presentes, um embrulhado e outro abraçado. Gostei muito mais do segundo. Foi o melhor presente que eu poderia ganhar.
Para mim, foi a primeira vez que a tal brincadeira fez jus ao nome e verdadeiramente tirou um amigo da categoria de oculto.
Antonio Carlos Sarmento
Prezado Antonio Carlos:
Por vezes, o sorteio do amigo oculto nos traz decepções. Por outras, grandes alegrias, capazes de arrefecer sentimentos negativos, como foi o caso do Rui e da Zelia.
Sds. e um bom domingo.
Carlos Vieira Reis
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Amigo Carlos,
Grato pela constante presença por aqui, meu amigo.
É sempre um prazer este nosso contato.
Espero que o amigo esteja bem e desejo uma excelente semana!
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Olá Meu Amigo Sarmento, Muito bom dia, Mais uma das inúmeras belas crônicas suas . . . De fato, é muito difícil reconhecermos as faltas que cometemos, contudo, é maravilhoso, sensível mesmo, quando fazemos ou assistimos esse reconhecimento em público. Parabéns!!! Recomendações à Sônia e demais familiares, sobretudo os de além-mar.
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Amigo JH,
Você tem razão. A reconciliação é algo belíssimo, que emociona e engrandece o ser humano.
Muito obrigado por comentar, meu amigo.
Desejo uma ótima semana a você e aos seus queridos.
No final de semana que vem já estarei de volta ao Brasil.
Grande abraço!
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Que história linda! Adorei o “final feliz” dela. Temia alguma vingança ao final ou qualquer coisa do tipo, confesso hahahahaha
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Tati,
Me diverti com o seu comentário ao dizer que imaginou um final “infeliz”…
Agradeço muito pela sua presença, que muito me alegra, pois admiro o seu trabalho.
Desejo uma ótima semana!
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Crônica maravilhosa! Sarmento suas crônicas iluminam meus domingos pois as leio depois de orar, então, creio que meu coração está mais leve. Mas devo te contar uma coisa que me parece nos unir alem do que ja me considero unido a voce pelas crônicas. Tenho horror a amigo oculto por um motivo: SEMPRE me dou mal! Uma vez ganhei um perfume (coisa que é bem pessoal) que ja fora usado e acrescentado um pouquinho de álcool pra completar, alem do que, a tampa vazava demonstrando que ja fora usado! Outra vez, ganhei um desses brindes de empresa que o cara deve ter ganho de brinde, que tinha alguns apetrechos para que gosta de acampar no mato! Programa que eu nunca faria! Até apoto tinha… Passei o almoço todo usando o apito porque me perguntavam porque o apito e eu dizia que ganhei do fulano , que estava presente. Vingança boba e cruel… Bem chega de falar de minhas péssimas experiências. Ainda teria algumas. Kkkkkkk Bom domingo, obrigado pela crônica e fiquem com Deus.
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Amigo Luigi,
Mais um aspecto em comum entre nós. Interessante como ao longo das crônicas vamos encontrando pontos que nos aproximam em gosto e comportamento pessoal. Infelizmente estamos em países diferentes, senão seria muito bom nosso contato pessoal constante e o desfrutar de uma amizade plena.
Agradeço sua gentileza de sempre e o compartilhar de suas histórias.
Desejo ao amigo e à sua família uma maravilhosa semana, na paz de Deus!
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Que maravilha esse presente do Rui, fez toda a diferença.
Interessante o início da crônica, era o mesmo que eu pensava alguns anos atrás.
Porém, o “amigo oculto”, vem sendo realizado de várias formas e com a adaptação de mudanças para cada situação.
Ex: Na minha família, por ser muito grande o número de participantes, é o ideal.
Além das brincadeiras, e das gargalhadas durante a apresentação, ninguém fica sem presente…
E vejo também que em até algumas situações vão se criando outras variantes, com cartões de Natal, inimigo oculto( presentes engraçados com as características do sorteado… ex: Alguém recém-avô receber um babador, por ficar babando pelo neto…
E por aí vai…
Hoje em dia penso bem diferente e sou a favor do amigo oculto.
Bjs
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Amigo Chico,
Eu concordo com você, para variar… As variantes da brincadeira são interessantes e se adequam bem a certas situações.
Imagine o almoço do Caxambi sem este recurso: impraticável, né?
Grande e saudoso abraço, meu irmão. Beijos no Pedrão e na Helen. Em breve estaremos juntos novamente!
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Almoço no Cachambi , impossível de dar presentes sem o artifício do Amigo Oculto.
Bjs
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Realmente não há nada como o passar dos dias/tempo para esfriar a cabeça e perceber o “amigo/inimigo oculto” que vive dentro de nós. E depois, se for caso disso, reconhecer com humildade que erramos, pedir desculpa, valorizar o que deve ser valorizado, etc.
Eu prefiro este “amigo oculto” interior….
Mas o que escreve hoje não deixa de ser uma história bastante curiosa, ternurenta e com final feliz sobre esse jogo.
Boa semana!
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Dulce,
Interessante e profundo o seu comentário: de fato, o verdadeiro jogo de “amigo oculto” se dá no interior de cada um.
Agradeço mais uma vez sua presença e seus preciosos comentários.
Desejo uma ótima semana!
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Boa reflexão irmão!!!
Me lembrei quando entrei num emprego novo e todos falavam mal de uma moça, que tive a sorte de tirar ela no amigo oculto .
Comprei um bom presente,escrevi um cartão e a descrevi com respeito.Ela ficou emocionada e grata que até hoje quando me vê atravessa a rua e vem me abraçar!!
Como é bom tratar bem as pessoas e
se tornar inesquecível !!!!
Bjkas lusitanas! 😘
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Minha irmã,
Obrigado por compartilhar mais uma história feliz de amigo oculto. Como disse a Dulce Delgado em seu comentário, tudo depende do amigo oculto interior, que em você é amoroso e sensível.
Beijos em todos, especialmente no Tom.
Até breve, minha irmã.
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Cacau, a crônica me lembrou de uma situação cônica e triste com uma Tia. Eu fui me referir a ela e fiz uma brincadeira, ela não gostou e ficou um bom tempo sem falar comigo. Depois de um bom tempo, retomamos a convivência….Bjs
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Querida Prima,
Às vezes a brincadeira pode não ser bem recebida ou interpretada. Já vi acontecer e, como é em público, ganha uma dimensão maior…
Felizmente a sua história terminou bem.
Beijos e obrigado por comentar!
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Amigo oculto muitas vezes é essencial mas , a pessoa escolher o presente acho o fim . Participei de alguns numa empresa que trabalhei no Rio é que era dessa forma. Me lembro que o valor estabelecido era de 15 reais. Um dos colegas pediu 15 raspadinhas de 1 real cada. Inusitado, certamente
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Lucia,
Esse caso da raspadinha quase chega ao ridículo do que certa vez, de brincadeira, sugeri em família: cada um coloca o valor num envelope e faz-se a troca… Não tem sentido!
Fiquemos com o lado bom do jogo, né?
Beijos e uma ótima semana!
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Querido amigo Antônio Carlos, bom dia, o contexto desta crônica foi a “Crônica do arrependimento” entre a Zélia e o Rui e por fim a reconciliação. Parabéns pela descrição do fato com bastante alegria.
Eu particularmente também não gosto de “amigos ocultos”. Teve um final de ano, alguns anos atrás, que resolvemos fazer um amigo oculto no círculo bíblico que partipamos, que na época contava com 10 casais. Seria um amigo oculto para o casal. Corremos e compramos um belo conjunto de banho/casal e partimos para o encontro. Resultado? O nosso “casal oculto” esqueceu que tinha esta tarefa neste encontro e vieram “de mãos abanando” e ficamos sem o nosso presente, mas mesmo assim não tivemos nenhum descontentamento da nossa parte pois estávamos reunidos em nome de Deus que a tudo perdoa. Um grande abraço e fiquem com Deus.
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Meu querido amigo Aylton,
Se eu soubesse antes desta sua história teria inserido na crônica: incrível!
Fico curioso se o casal, mesmo tardiamente, reparou o erro…
Obrigado por compartilhar a história, meu amigo.
Uma ótima semana para você, Regínia e toda a família!
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Querido amigo.
Você nos surpreende com as ideias de tema. Quem não tem uma história de amigo oculto para contar?
Sempre leio os comentários que são postados antes de enviar o meu e eles enriquecem ainda mais o seu conteúdo. Hoje então, os comentários foram muito interessantes e mostraram como o assunto é polêmico.
Parabéns amigo. Pode incluir essa crônica na lista das melhores,inspiradora e reflexiva. Já estou no RJ e depois trocamos a respeito.
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Meu querido amigo Nei,
A história é que é muito boa. Só me coube botar no papel, aliás, na telinha…
Vou botar na lista das que você mais apreciou, pois sei que sua peneira é fina!
Um grande abraço meu amigo. No próximo final de semana nos falamos para botar a conversa em dia.
Beijos na Jaciara!
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Bom dia querido amigo!
Ótima crônica! Quem não passou por isso nas empresas?
Uma abençoada semana para vocês.
Abraços.
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Muito obrigado, meu amigo Newton!
Desejo que estejam bem e Nuri totalmente recuperada.
Tenham uma ótima semana!
Abraços.
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Cacau, seleciono essa de hoje como uma das melhores e emocionantes que você já nos escreveu.
Obrigado, ela também nos educa !
Abraços
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Caro Adilson,
Agradeço a gentileza de seu comentário. Tenha certeza de que sua preferência me interessa muito, pois sei que é um leitor assíduo e apreciador das crônicas.
Desejo ao amigo e sua família uma ótima semana!
Abraços.
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Meu jovem Amigo Antônio Carlos, eu gostei muito dessa crônica,
é como se degustar da leitura através de um excelente vinho.
Para Deus, todos os momentos do tempo estão presentes em sua atualidade.
Ele estabelece, em seu projeto eterno a predestinação.
Parabéns pela crônica.
Osluzio Félix
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Meu amigo Osluzio,
Obrigado por seu gentil comentário.
Pelo jeito o amigo tem lido a crônica acompanhado de uma bela taça de vinho…
Bom proveito, meu querido!
Beijos em toda a família.
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Querido primo,
Zélia soube aproveitar a oportunidade que a brincadeira oferece: aproximar as pessoas.
E isso não é entendido por muitos: não há interesse nem disposição para fazer novos amigos.
Não há nem respeito, haja vista que damos um bom livro e recebemos um pacote de balas. Tudo na contramão da confraternização.
Felizmente, alguns têm mais sensibilidade e promovem uma troca de carinho, de valorização e de alegria.
Ainda há outros que protagonizam cenas surreais, como a do colega que não deu nem recebeu. Ficamos decepcionados achando que se cometeu um erro na distribuição dos papéis. Imagine! ele justificou que havia tirado ele mesmo, mas, como estava com pouco dinheiro para comprar presente, não falou nada.
Sempre gostei de participar e de escolher um mimo que agradasse ao amigo. Queria mesmo prestigia- lo.
Dedicar consideração a alguém é um presente valioso que se oferece.
Beijos
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Minha querida prima,
Sem dúvida você está entre aqueles que “têm mais sensibilidade e promovem uma troca de carinho, de valorização e de alegria.”
Seus comentários são para mim um valioso presente.
Obrigado!
Beijos e fique com Deus!
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Mais uma vez, parabéns!
Sua crônica despertou lembranças em muita gente.
Que desfecho lindo, a possibilidade de mudarmos algum sentimento que empobrece a vida, tornando-o conciliação e carinho.
Feliz quem é capaz de mudar!
Um abraço grande e voltem em paz.
Boa viagem!
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Querida amiga Helena,
Obrigado pelo comentário sempre gentil e interessante. “Feliz quem é capaz de mudar!”
Chegamos de volta na sexta-feira e agora ficaremos por aqui até o final de ano.
Um afetuoso abraço!
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